Quarta-Feira, 26 de março de 2025

Postado às 14h00 | 25 Mar 2025 | redação Ex-promessa diz que perdeu quase R$ 1 milhão por vício em apostas

Crédito da foto: Arquivo Pessoal Dodô foi campeão na passagem pelo Bahia

Por Emilio Botta —  ge / São Paulo

 

Paulo Henrique Athanazio viu o jogo deixar de ser paixão para se tornar no seu principal inimigo. Aos 25 anos, o jovem que despontou como promessa no interior de São Paulo agora não consegue mais ir a campo para fazer o que mais amou um dia: jogar futebol. Tudo isso pelas consequências que o vício em apostas online trouxe para a sua vida.

Há três anos, Dodô, como é conhecido, começou a fazer apostas esportivas como brincadeira e uma forma de ganhar um dinheiro extra para complementar a renda. Com o passar do tempo, os valores apostados foram aumentando e os bens conquistados ao longo da carreira como jogador diminuindo. Ele vendeu o carro, o apartamento, esgotou as economias e viu a família se distanciar.

– Comecei nessas apostas esportivas através de outras pessoas, que eram do meio do futebol. Eu vi que ganhava, que perdia e aí comecei a pegar interesse e fazer alguns joguinhos. Fazia de R$ 10 para tentar ganhar R$ 1.000 e não conseguia. Eu ia jogando e vendo coisas da internet, desses caras que apostam, que tinha que aumentar o valor e diminuir o número de jogos. E fui pegando esse costume: jogava e ganhava, perdia, ganhava, perdia. Teve vez que eu ganhei R$ 50 mil no final de semana, teve vez que perdi os R$ 50 mil.

– Eu percebi que estava viciado quando comecei a deixar de focar no futebol. Por exemplo, a gente tinha que treinar 8h da manhã, eu apostava em jogos da Austrália, da Coreia, que começavam duas 2h da manhã e acabavam 4h30, 5h manhã e aí ia dormir. Perdia a aposta e dormia poucas horas de sono e no outro tinha que treinar. Meu rendimento dentro de campo ia caindo. Teve uma época que percebi que tava desfocado, que eu ficava viciado: perdi, mas vou recuperar, perdi, mas vou recuperar, mas ia só perdendo, perdendo – disse, em entrevista ao ge.

 

Mais sobre Dodô

Nome: Paulo Henrique Athanazio

Idade: 25 anos

Posição: meia-atacante

Carreira: Comercial-SP, Botafogo-SPBahiaMirassol, Grêmio Prudente, Anápolis, Catanduva, Uberaba, Desportiva Ferroviária, Democrata-MG e Campinense.

Dodô admite que passou a pedir dinheiro emprestado e mentir sobre o destino do valor. O resultado disso foi o distanciamento do futebol e a queda na carreira, passando por clubes menores e não conseguindo se firmar. O motivo, segundo ele, é que os empréstimos feitos com colegas de elenco acabam rachando o grupo pela falta de pagamento por parte dele.

Segundo Dodô, o prejuízo com as apostas chegou a quase R$ 1 milhão.

– Comecei a apostar com R$ 10, o valor mais alto que eu já apostei foi no jogo do Corinthians: R$ 50 mil. O Corinthians perdeu para o Racing, da Argentina, e foi quando eu perdi. Eu consegui ganhar, mas perdi. Hoje eu não tenho nada na conta, somando aquilo que eu tinha, cheguei num prejuízo de R$ 967 mil.

– Pegava dinheiro emprestado com os amigos, colegas de futebol. Era para apostar e contava até história triste. Para você ter noção do nível que estava de pessoa ruim, de mentiroso. Eu aparentava ser uma pessoa normal, porque dava risada, brincava, no dia a dia estava tudo bem, só que ninguém nunca percebeu esse vício, a não ser a minha mãe, algumas outras pessoas mais próximas, mas de resto ninguém percebia. Eu não demonstrava, era uma pessoa tranquila, sorridente, que só brincava.

Dodô na passagem pelo Bahia — Foto: Arquivo Pessoal

Dodô na passagem pelo Bahia — Foto: Arquivo Pessoal

A maior perda de Dodô foi o convívio com pessoas da família. A mãe o acolheu e até fez um empréstimo para ajudar o filho a pagar as dívidas, atualmente na casa dos R$ 120 mil. O atacante diz que o apoio familiar foi fundamental. Ele não buscou ajuda profissional e atualmente trabalha como pedreiro, lavando casas e roupas.

– Perdi meu apartamento, tive que vender para poder pagar dívida de aposta. O carro tive que vender também para pagar dívida de aposta. O dinheiro de bicho que eu pegava era para pagar aposta. Eu tinha uma causa com o Bahia na Justiça, peguei um dinheiro bom também, tive que pagar aposta. Eu tinha uma quadra de areia com um outro sócio, vendi também para pagar aposta. Vendia as minhas chuteiras, vendi relógios. Sujei meu nome, tudo que você imaginar de valor eu perdi.

– Uma mãe que sempre me apoiou, mas com as apostas fui perdendo, não foram mais confiando em mim e acabei perdendo a mulher da minha vida, perdi a minha mãe, minha filha. A mãe da minha filha, que não é essa pessoa que eu falei, não me deixava ficar muito com a minha filha, porque ela tinha medo, mas entendo, ela queria proteger.

Hoje eu tenho umas cinco trocas de roupa, um tênis que ganhei. Não tenho nada, nem R$ 3 na conta.

— Dodô.

Dodô foi campeão da Segundona paulista pelo Grêmio Prudente  — Foto: João Paulo Tilio / ge

Dodô foi campeão da Segundona paulista pelo Grêmio Prudente — Foto: João Paulo Tilio / ge

Atualmente sem clube, Dodô entrou em campo apenas duas vezes em 2025 durante a breve passagem pelo Campinense. O meia-atacante também tem feito jogos na várzea na região de Sertãozinho, no interior de São Paulo, para complementar a renda enquanto aguarda uma nova oportunidade no futebol.

– Muita gente está me ajudando. Minha mãe me aceitou de volta em casa. Mas eu ainda tenho essas dívidas, é muito complicado porque me atrapalha um pouco, mas sempre quando vejo falar sobre o jogo, essas coisas, eu saio de perto. Eu não dou muito conselho. Não é fácil, você sai do nada e com 24 anos ter perdido R$ 1 milhão em cinco anos...

 

Tags:

Dodô
jogador
futebol
jogos
vício

voltar