Segunda-Feira, 24 de fevereiro de 2025

Postado às 12h45 | 24 Fev 2025 | Presidente do TCU diz que Previdência é uma 'bomba que não vai parar de explodir'

Em 2023, o governo estimou que o rombo do INSS deve mais que dobrar até 2060. Queda da natalidade e aumento do salário mínimo acima da inflação pressionam o déficit. Analistas defendem novos ajustes nas regras de benefícios previdenciários

Crédito da foto: Reprodução Instituto da Previdência Social

Por g1

O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Vital do Rêgo, avaliou que com o envelhecimento da população no Brasil e a queda dos nascimentos, ou seja, as chamadas "mudanças demográficas" em curso, a Previdência Social é uma "bomba que não vai parar de explodir".

Em 2023, o governo estimou que o rombo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sistema público que atende aos trabalhadores do setor privado, deve mais que dobrar até 2060 e quadruplicar até 2100.

Analistas já tinham apontado, no ano passado, que a queda dos nascimentos no país, aliado à política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de conceder reajustes acima da inflação ao salário mínimopressionará o déficit previdenciário no país nos próximos anos.

 

"Quando eu entrei aqui [no TCU], dez anos atrás, nós tínhamos cinco contribuintes [trabalhadores] para cada beneficiário [aposentado ou pensionista, por exemplo]. Hoje nós temos 1.7 [com as mudanças demográficas]. Aí inviabiliza completamente, porque não só é aposentadoria, são benefícios, é todo o processo (...) Nós estamos com um paciente que está absolutamente debilitado e, até agora, eu não vejo remédio para tirar desse quadro. As notícias que têm são muito desanimadoras", afirmou Vital do Rêgo, em entrevista exclusiva ao g1 e à TV Globo.

 

Dados do Tesouro Nacional mostram que, somente com o pagamento de benefícios previdenciários a aposentados e pensionistas do INSS foram gastos cerca de R$ 960 bilhões em 2024. Para este ano, a previsão é de que este valor supere a marca inédita de R$ 1 trilhão. Essa é a maior despesa primária do governo federal.

Com isso, o rombo do INSS, ou seja, as despesas menos as receitas, somou R$ 297 bilhões em 2024. O valor mostrou relativa estabilidade frente ao ano de 2023, quando o déficit da Previdência totalizou R$ 306,2 bilhões.

Além do déficit do INSS, porém, também foi registrado rombo na previdência dos trabalhadores do setor público (RPPS) e, também, no pagamento de pensões e no sistema de "inatividade" dos militares. Esse rombo somou R$ 112,2 bilhões em 2024, contra R$ 111,5 bilhões no ano anterior.

Somado todo o sistema previdenciário do país (setor privado, público, militares e suas pensões), a o déficit somou a marca de R$ 410 bilhões no ano passado.

Os gastos previdenciários, assim como as regras de seguro-desemprego, abono salarial e o pagamento de salário dos servidores públicos, são classificados como gastos obrigatórios, ou seja, não podem deixar de ser pagos.

Medidas antifraudes

Para tentar conter o rombo e manter a sustentabilidade do sistema previdenciário brasileiro, o presidente do TCU, Vital do Rêgo, defende a adoção de medidas para coibir fraudes nos sistemas previdenciários do país.

"Coibir fraudes para poder diminuir o tamanho do prejuízo, o tamanho do rombo da Previdência. E isso não precisa de reforma constitucional. O país caminha para um processo que, a médio prazo, tornar-se-á difícil você pagar o aposentado. Ele não quebra, o país não quebra, mas para pagar o aposentado, ele vai ter condições, porque eu coloquei aqui situações que são estruturantes, importantes", declarou o ministro Vital do Rêgo.

No ano passado, o governo levou adiante um "pente-fino" em benefícios previdenciários temporários, como o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença). A meta foi revisar 800 mil processos para confirmar se o pagamento era de fato devido.

Em 2019, o governo do presidente Jair Bolsonaro levou adiante uma reforma da Previdência, capitaneada pelo então ministro da Economia, Paulo Guedes.

Entre as mudanças, foi instituída uma idade mínima de aposentadoria de 62 anos mulheres e de 65 anos homens. Também foi definido um tempo mínimo de contribuição de 15 anos para mulheres e de 20 anos para homens.

Com as mudanças, o antigo Ministério da Economia, comandado então por Paulo Guedes, estimou, em 2019, que a reforma teria um impacto potencial de reduzir o rombo previdenciário de R$ 800 bilhões a R$ 1,07 trilhão em dez anos.

O presidente do TCU, Vital do Rêgo defendeu que alguns gastos sejam reclassificados. São eles: o sistema dos militares e, também, a previdência rural. Esses pontos já foram elencados por especialistas como passíveis de ajustes no futuro.

"Eu acho que o assunto não é de ter uma outra reforma, não. É cumprir o que está lá e enfrentar temas delicados, como o tema da Previdência Militar. Na Previdência, eu sempre discuti, por exemplo, a Previdência Rural. A Previdência Rural, para mim, não podia ser previdência, ela tinha que ser assistência. Por quê? Porque foi pós-88 que todos os cidadãos do campo receberam a aposentadoria como um prêmio de sua vida. Mas eles não contribuíram com nada, zero", declarou Vital do Rêgo, presidente do TCU.

No fim do ano passado, a equipe econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou ao Congresso Nacional, após negociação com os militares, um projeto de lei que estabelece uma idade mínima de 55 anos para a aposentadoria dos militares.

A aposentadoria militar acontece quando há a passagem da ativa para a reserva remunerada. Hoje, são necessários 35 anos de serviço às Forças Armadas, mas não há idade mínima.

O texto, que ainda não foi votado, prevê, ainda, outras três mudanças:

- o fim da chamada "morte ficta" dos militares — pensão recebida quando são expulsos ou excluídos das Forças Armadas;

- a extinção da transferência da pensão militar;

- uma contribuição ao Fundo de Saúde em 3,5% do salário dos militares até janeiro de 2026.

- se aprovado, a projeção é de um impacto positivo de R$ 2 bilhões por ano.

 

 

"A sociedade brasileira tem que discutir qual o padrão de Forças Armadas que nós queremos. Porque o estilo que está hoje, ele está errado. Porque você dá um privilégio, certo. Por quê? Porque a função é diferente. Se a função é diferente, então vá para outro setor que não seja a previdência social. Crie uma rubrica para ali. Se você dividisse setores, ficaria muito mais fácil para você criar políticas públicas corretivas nesses setores especializados", disse Vital do Rêgo.

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